sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Mãe, querida mamãe!

 
 
    "Estava aqui, tropeçando num monte de palavras, me engasgando com um turbilhão de sentimentos, perdida em meu mundinho de lembranças, saudades e pensando no próximo 2º domingo de maio – o famoso e tradicional (comercial) “dia das mães” quando, de repente, ouço aquele ‘psiu!’!
No limiar da porta, vejo então uma cabecinha toda branca espichando-se para chamar minha atenção e, olha só: aí está você, no agora de hoje vivendo o seu dia – linda, alegre e faceira dentro do meu dia-a-dia! Meu coração se enternece e corro para mais um dos nossos frequentes abraços de todo dia!
Há pouco, uma vaga nostalgia me levava para longe daqui, evocando lembranças, buscando aquela mulher que sempre acompanhou cada passo da minha vida. Mas onde poderia eu encontrá-la senão aqui, neste momento de agora em que a mulher que sou abraça e beija com ternura esta mulher que você continua a ser?!
 
    Não importa se você lembra ou não do meu nome ou do parentesco que existe entre nós! Tudo o que importa é esse sorriso largo que ilumina o seu rosto quando me vê e essa sensação confiante, prazerosa, que podemos partilhar no calor do nosso abraço!
Ah mãe! Quantas experiências de vida, trilhando juntas! Fases boas, fases difíceis, momentos felizes, momentos tristes… Minhas enfermidades – seus cuidados e preocupações. As birras da criança versus a mãe autoritária. As inconsequências adolescentes versus a mãe vigilante! E aquela jovem adulta, empinando o nariz e fugindo das suas críticas decorrentes do inevitável confronto de personalidades e gerações diferentes!? O meu jeito de ser e o seu jeito de ser, ora gerando harmonia, ora gerando atritos.
 
    Esses percalços naturais da caminhada pela vida, aqueles em que as relações se estremecem até mesmo quando nós filhos já somos adultos, não merecem relevância para serem pontuados como entraves para o amor e o carinho que lhe dedicamos. Tudo vivido, tudo passado e tantas novas experiências ainda nos esperando para viver!
 
    E no seu lento caminhar, o vazio da sua memória vai me ensinando mais uma lição: despojar-me das bagagens do passado para sentir, com leveza, as surpresas do agora! Cada dia, um novo dia e cada momento sempre único e irrecuperável – sem passado e sem futuro, só comportando o presente desse agora tão cheio de oportunidades para ser vivido da melhor forma possível!
 
    Creio que o Mal de Alzheimer traz em si essa profunda mensagem: numa mínima fração de segundo cabe toda uma vida e o tempo, com toda a sua carga de lembranças… bem, essa contagem que dele fazemos e o excesso de peso pelas lembranças que carregamos em nossa memória, é apenas um recurso humano para não nos desorientarmos enquanto transitamos no espaço.
Percebo, mãezinha, que a vida nos presenteou com a bênção de ver você e papai envelhecerem juntos trilhando os caminhos do bem viver. Sinto-me especialmente privilegiada pela oportunidade de ter acompanhado meu pai até o momento final e de agora poder continuar contando com a sua companhia. Isto nada tem a ver com obrigação, nem com reparação de sentimentos de culpa ou mesmo com gratidão, mas tem tudo a ver com amor, aprendizado e fortalecimento espiritual!
 
    Repito aqui os versos finais de um poema que escrevi para vocês dois, intitulado ‘Tempo Mestre’: 
 
"...Tempo chegou / e eu envelhecendo…/ Nas rugas do rosto, /
tempo marcando / as trilhas do caminho / que no tempo percorri… /
Abençoado tempo! / flashes de momentos / que contam uma história /
escondida na memória / esquecida do que vivi… /
Tempo pai! / Tempo mãe! / Eis o meu tempo /
chegando de mansinho / trazendo o que se vai /
 e ensinando-me a partir…"
 
    Assim, tudo que hoje sei é que muito mais preciso aprender e que cada fração de segundo traz um leque de oportunidades para descobrir, exercitar e ampliar os limites dessa bagagem indispensável que precisamos ter sempre à mão para seguir com mais leveza a jornada de nossas vidas tais como: paciência, tolerância, aceitação e desapego.
 
    E seguindo a trilha do poema “VIDA” de Mário Quintana, quero aproveitar cada oportunidade desses tempos para ir “jogando fora a casca dourada e inútil das horas” enquanto ainda tenho tempo para dizer olhando em seus olhos que “você é extremamente importante para mim” e o quanto eu te amo! Meu grande beijo para você, minha mãe!
 
    E àqueles que ainda podem beijar suas mães, eu peço: não percam tempo, aproveitem para todo dia beijá-las tanto quanto puderem!!!
 
Por: Gracinha Medeiros
 
 
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